Arquivo para segunda mão
“Segunda mão” está na moda
Grifes européias aderem ao conceito de sustentabilidade e abrem as primeiras lojas onde se pode vender e comprar peças usadas da própria marca. O cliente economiza e sai com a consciência limpa. É vida nova para a roupa velha. No Brasil, essa moda ainda não pegou, mas os brechós virtuais se alastram
O imediatismo e as mudanças rápidas estão cada vez mais freqüentes no mundo da moda. Em poucas semanas há uma nova coleção nas prateleiras: a cliente nem curtiu ainda a compra do mês passado e já há mais novidades para consumir. Mas essa característica passageira e descartável é custosa não só para o consumidor, como também para o meio ambiente.
A indústria têxtil é considerada uma das maiores economias do mundo, dada sua intensa atividade. Usa, como matérias-primas básicas, fibras naturais (lã, seda, linho, algodão) e artificiais (acrílico, poliamida, poliester, elastano, lycra). As últimas, feitas de petroquímicos, são mais baratas e práticas. Mas, infelizmente, mais poluentes durante o processo de produção e, também, porque levam anos para serem recicladas (o nylon, por exemplo, precisa de 30 a 40 anos para se decompor).
Um estudo da Universidade de Bangalore, na Índia, acompanhou todos os processos de produção de uma roupa e mostrou como ele é poluente tanto para o ar como para a água. As etapas de tingimento e impressão utilizam muita água e químicos e emitem uma enorme quantidade de agentes voláteis na atmosfera, particularmente tóxicos para nossa saúde.
Gradualmente, nos últimos anos, a indústria têxtil tem investido em pesquisas para diminuir o impacto ambiental de sua produção e também encontrar novas soluções, como o uso de tecidos e fibras que durem por um tempo maior e sejam produzidas de forma mais natural.
MUDANÇA DE COMPORTAMENTO
Mas não basta a indústria investir em novos padrões, se o varejo e o consumidor final também não estiverem antenados com a necessidade de mudança. Tecidos, como o algodão biológico, por exemplo, ainda custam caro, se comparados às matérias-primas tradicionais.
Mas é da Suécia o exemplo que pode minimizar a culpa do mundo fashion. Várias marcas decidiram abrir lojas de segunda mão – Second Hand Stores. A marca de sportswear Filippa K inaugurou a sua, em Estocolmo, no ano passado. Nela, o cliente pode vender peças de coleções antigas (que obviamente são avaliadas e tem o preço estipulado pela loja) ou, então, levar uma roupa da marca – usada ou muitas vezes, quase nova – para casa. “Foi muito legal abrir uma loja com essa proposta. Ficamos orgulhosos de poder trabalhar com sustentabilidade de uma nova maneira”, afirma Filippa Knutsson, fundadora e sócia da marca. A reação dos clientes tem sido muito positiva. “Eles veem a loja como um lugar onde se pode tomar decisões conscientes tanto ambiental como economicamente”.
O cliente da grife pode levar as peças antigas até a loja e ganhar um desconto de 10% na próxima compra ou, então, doar esse valor para instituições de caridade. A roupa usada é lavada, reformada (se necessário) e vendida como second hand. A iniciativa fez tanto sucesso que a Boomerang decidiu ampliar a novidade para toda a linha, não somente a infantil. Roupas masculinas e femininas usadas também podem ser “devolvidas” nas lojas. “Futuramente queremos ter um espaço para roupas usadas em todas as nossas lojas”, revela Catti.
As peças entregues na Boomerang, mas que não estão mais em condições para serem reutilizadas não vão para o lixo. São reaproveitadas como matéria-prima em artigos para casa e decoração, como colchas, tapetes e toalhinhas de mesa e cozinha.
Reciclagem também é a palavra-chave na Acne Studios. O projeto chamado Acne Archive (Arquivo da Acne) transforma peças de antigas coleções, usadas em desfiles ou showrooms ou, ainda, algumas que nem chegaram nas lojas. Todas são vendidas a preços mais baixos. Na abertura da loja em Estocolmo, havia fila de clientes esperando para garimpar algum achado da marca. Para o diretor criativo da Acne Studios, Jonny Johansson, “é maravilhoso saber que essas peças estão ganhando vida nova”.
Infelizmente, parece que a onda das lojas de marca que vendem peças de segunda mão se restringe à Suécia. No resto do mundo, ainda proliferam-se as lojas multimarcas ou os outlets, que vendem por preço mais barato roupas ou produtos de coleções passadas das grandes grifes. Mas tudo novo, sem uso.
Mas, no meio desse gigante mundo virtual, há também gente preocupada com a questão do consumo excessivo. A médica carioca Fernanda Vieira, de 26 anos, decidiu criar o site “O que é meu pode ser seu”
O blog “Enjoei” foi criado em abril deste ano e já tem cerca de 2.500 acessos diários. Ideia de um grupo de amigos, tem layout produzido e texto divertido, bem-humorado. Vende e compra roupas e sapatos. Com o crescimento do site, a equipe já pensa em abrir um espaço – que chamará “Quero doar” – para dar dicas aos clientes que queiram repassar suas peças antigas para instituições de caridade. Esta é a hora e a vez das roupas usadas!
Por: Suzana Camargo, da Suiça – Edição: Mônica Nunes para o site Planeta Sustentável